Mais
cedo ou mais tarde o foca percebe que precisa de algo mais para imegir
socialmente entre os novos colegas jornalistas. Ser legal não é
suficiente. Ser bonita(o) serve, mas apenas para o sexo oposto - e às
vezes para o mesmo, também. Ser muito inteligente causa discórdia. Para
que o pobre neófito redacional não se sinta perdido ao adentrar no
viveiro de cobras malcriadas da redação, eu ofereço aqui carinhosamente
algumas dicas preciosas. Mas atenção: não me responsabilizo por
eventuais efeitos colaterais.
1 - Seja escroto
Caso
você ainda não saiba, ser bonzinho está totalmente fora de moda. Só é
respeitável o jornalista que tem pinta de malvado e fala muito palavrão.
É claro que poucos são maus de verdade, mas o importante é a aparência.
Você nem precisa ser totalmente perverso; basta demonstrar um certo
viés negativo, obscuro, como se estivesse perdendo a luta para não se
deixar levar pelo lado negro da força.
Quando
as pessoas olharem para você, não é necessário que vejam um psicopata
completo. Meio psicopata já basta. Sua imagem deve deixar uma leve
incerteza no ar sobre se você realmente tropeça velhinhas na rua, cuspiu
no tapete do Papa ou peida em elevador cheio.
2 - Fale mal de tudo
É
uma clara continuação do primeiro tópico: nunca algo estará
satisfatório para alguém realmente malvado. No seu jornal, o pauteiro é
burro, o editor é anta, o chefe é jumento, a empresa é uma Arca de Noé e
os textos publicados são todos uns excrementos - exceto o seu e de um
ou outro amigo próximo. Aliás, quando o seu texto sai ruim, a culpa é do
editor. E se você é editor, obviamente, os repórteres é que são os
analfabetos.
Se
este procedimento for feito da maneira correta, em vez de ser execrado
você será respeitado. Eventualmente poderá ser demitido, mas continuará
respeitado.
3 - Use drogas
Não
só as lícitas, seu bundão. Mas comecemos por elas. Encher a cara é
elementar para interagir, de preferência tendo várias histórias hilárias
de porres. Quanto maior o ridículo já passado por conta do álcool,
maior respeito ser-lhe-á imputado.
Um
dia desses conheci um antigo repórter da Província e do Diário
perambulando como mendigo na rua, barba de noé, fala atrapalhada, mas
frases coesas. Ele contou rápido sua história, citou muitos jornalistas
que conhecia e no final, disse "perdi para a cana...". De súbito, me
veio um respeito enorme por ele.
O
cigarro também dá um certo ar de confiabilidade. Não se preocupe,
ninguém olha para seu pulmão preto. E cada vez menos jornalistas se
preocupam em negar o uso da maconha, já tão comum. O fininho é útil,
pois dá um ar de guerrilheiro zapatista. Já outros entorpecentes não são
assim muito necessários, mas se quiser usar, tanto faz. O que é um
peido pra quem tá cagado?
4 - Tenha pose
No
fundo, jornalistas se acham. No raso, têm certeza. Treine o olhar de
Clark Gable, segure o cigarro com pose de atores dos anos cinquenta e
mentalize "eu sou safo" como um mantra. Tudo isso ajudará a convencer os
outros e você próprio do estupendo glamour da profissão. Você tenta se
segurar, mas isso exala inevitavelmente do seu ser.
Sua
pose deve mostrar o quanto você é mau. Na hora do trabalho, é
interessante alternar momentos de gargalhadas em altos decibéis com
olhares de seriedade profunda. Só não alterne demais os dois momentos,
porque esquizofrenia e bipolaridade ainda não são desejáveis na redação.
A não ser que você seja chefe, claro.
5 - Auto promova-se
De
vez em quando comece frases com expressões do tipo "quando eu ganhei o
prêmio tal..." e "porque a minha manchete de ontem...". Jornalista não
tem o menor pudor em se exibir. Em qualquer trunfo passe verniz,
multiplique por três e propague com um certo tédio, como se já fosse
corriqueiro na sua vida.
Em
momentos que quiser mostrar sua humildade e modéstia, solte frases com a
seguinte fórmula: "Fulano nunca ______(algo que você já fez) e já tá se
achando". Por mais ridícula que a auto promoção soe, é incrível como
funciona. É uma espécie de marketing pessoal extremo.
Óbvio que se você exagerar, vai acabar sendo mal visto. A não ser que seja chefe, claro. Chefe é sempre mal visto.
6 - Seja uma pseudo-enciclopédia
Seja
metido a saber de tudo. Soltar jargões profissionais de qualquer área
faz você parecer muito safo. Afinal, em poucos meses de labuta, qualquer
estagiário já entrevistou macumbeiros, astronautas, artistas querendo
aparecer, políticos querendo desaparecer, físicos nucleares, policiais
torturadores e até acopladores de carga de caneta Bic. Basta escrever
uma matéria especial sobre construção civil para o jornalista ganhar
especialização em engenharia.
Assim,
você sempre sabe um pouco mais do que todo mundo. Sobre qualquer fato
relevante na política e economia, você é capaz de soltar "mas isso não é
tudo" ou "tem muita coisa por trás disso que vocês não sabem...". Nunca
revele o segredo, claro. Apenas deixe no ar que seu conhecimento sobre o
tema tem a espessura e profundidade de um buraco negro alargado pelo
Kid Bengala.
7 - Seja competente
De
forma alguma chega a ser uma condição impreterível, mas até que ajuda.
Mas atenção: só tem o efeito esperado se praticada em conjunto com as
últimas duas dicas.
8 - Seja estranho
Jornalista
não é muito normal e tem orgulho disso. A esquisitisse é uma forma de
se diferenciar dos seres inferiores - tipo publicitários, marqueteiros e
afins. Então aflore seu lado underground e regue sua genialidade
incompreendida. Use roupas "originais", tenha seu próprio "estilo" e
demonstre "personalidade", assim mesmo, entre aspas. Lembre-se: qualquer
coisa diferente e de difícil compreensão tende a ser respeitada.
9 - Dê para alguém
Não
é só dar uma vezinha. E também não é para qualquer um. Namorar um
superior ou veterano de redação pode ajudar na interação com os demais
colegas. Vale para relações homo e hetero, já que redações são apinhadas
de viados. Se não funcionar para ganhar o respeito de todos, ao menos
de seu par você já conseguiu.
Agora, se quiser sair dando para todo mundo, ninguém vai reclamar. Só temo que isso afaste você do objetivo deste post.
10 - Integre-se a uma panelinha
Essa
aqui vale até para grupos de cefalópodes. Se depois de tudo isso você
não ganhar a simpatia dos colegas, faça vestibulinho pra publicidade e
seja feliz.
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